O presidente da Câmara da Murtosa disse hoje esperar que a inclusão do barco Moliceiro na lista de património imaterial em necessidade de salvaguarda urgente da UNESCO traga maior visibilidade para este património e mais visitantes para a região.
“Isto gera-nos um profundíssimo sentimento de orgulho porque é um reconhecimento internacional, naturalmente. Sabemos a importância que tem a designação por parte da UNESCO dos patrimónios imateriais, porque gera, naturalmente, uma visibilidade acrescida sobre um património que é extraordinário, que é o nosso barco Moliceiro e a carpintaria naval da região de Aveiro”, disse à Lusa Januário Cunha.
O autarca encontra-se em Nova Deli, na Índia, onde o Comité Intergovernamental para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial da UNESCO decidiu hoje inscrever a arte da carpintaria naval da região de Aveiro, traduzida nos barcos moliceiros, na lista de património imaterial em necessidade de salvaguarda urgente daquela organização.
Januário Cunha, que está acompanhado do presidente da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA), Jorge Almeida, e do presidente da Assembleia Municipal de Albergaria-a-Velha, António Loureiro, referiu que esta decisão gera também grandes responsabilidades, “sobretudo na adoção de medidas que permitam perpetuar esta arte extraordinária e esta embarcação extraordinária que é o barco de Moliceiro”.
O autarca lembrou que a região tem um plano de salvaguarda que passa, em primeiro lugar, por “conseguir trazer para a arte gente nova” e “gerar apetência para a construção naval tradicional”, porque sem os mestres construtores não há barco moliceiro.
“Esse é um primeiro trabalho, que já iniciámos, aliás, com ações de formação na área da carpintaria naval, que queremos continuar a fazer”, disse o autarca da Murtosa, distrito de Aveiro, adiantando que outra das ações previstas é sensibilizar cada vez mais os mais jovens para a importância deste património.
Januário Cunha realçou, por outro lado, os efeitos que esta decisão poderá gerar do ponto de vista turístico e de atratividade territorial, uma vez que o moliceiro é uma embarcação única da região de Aveiro, afirmando estar “muito expectante relativamente a isso”.
“Agora que estamos nas bocas do mundo, aquilo que era um património conhecido na região na região centro e a nível nacional ganhará aqui uma escala muito maior, que nos obriga também a termos esta perspetiva de podermos não só ter estas medidas de salvaguarda, mas também de cada vez mais de divulgação acima de tudo do património, por via daquilo que é o expectável incremento também de visitantes para a região por via desta nomeação”, afirmou.
Atualmente, segundo o presidente da Câmara da Murtosa, existem quatro mestres construtores de barcos moliceiros no concelho, dois a trabalhar em permanência e outros dois que se iniciaram na atividade muito recentemente.
“Em 2009, quando foi criado o Estaleiro Museu do Monte Branco, existia um único mestre construtor a trabalhar na Murtosa, que era o mestre Zé Rito. Nós hoje já temos, além do mestre Zé Rito, o mestre Marco Silva, e temos pelo menos mais dois mestres que se estão a formar, digamos assim, e, portanto, dá-nos aqui uma ideia de expectativa e de esperança na perpetuação desta arte”, disse Januário Cunha.
O Barco Moliceiro havia já sido inscrito em 2022 no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, por iniciativa da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA).
Um dos aspetos singulares das embarcações são as pinturas da popa e da ré: “a proa é a parte monumental do moliceiro, em que figuras, desenhos e legendas são exclusivos, sem igual em qualquer tipo de navegação conhecido”, escreveu Jaime Vilar, em livro dedicado àquela embarcação.
Nesse trabalho, o autor classificava as legendas da proa em “satíricas, humorísticas e eróticas”, “religiosas”, “românticas, brejeiras e pícaras”, “profissionais, morais e históricas”.
O mesmo autor, baseando-se em dados colhidos junto dos artífices, descrevia que um moliceiro mede, em média, “15 metros de comprimento, desloca cerca de cinco toneladas e tem o fundo plano e de pouco calado, pormenor que lhe permite navegar por onde barcos de quilha não passam”.
Na década de 70 do século XX estavam registados três mil barcos moliceiros a operar na ria de Aveiro, mas estima-se que subsistam pouco mais de 50 embarcações, metade das quais afetas à exploração turística nos canais urbanos da ria.












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